Artigo de Rubens Mein
Publicado no Brasil 247
Muito já se disse e muito vai ser dito ainda sobre o retumbante fracasso
da seleção brasileira nesta última Copa do Mundo, especialmente nos
dois últimos jogos. Confesso que eu também me espantei com o tamanho e a
forma da surra que nos foi aplicada pela Alemanha. Antes dela,
estávamos todos docemente iludidos por uma fantasia que nós mesmos
tínhamos criado, numa espécie de autoengano coletivo.
Foi preciso acontecer o absurdo placar de 7 x 1 do Mineirão, seguido do 3
x 0 no Mané Garrincha, para que alguns de nós brasileiros
(infelizmente, nem todos) caíssemos na real. A mídia, as autoridades e o
público viviam um sonho errado, cultivado sobre valores e atitudes
totalmente equivocados. Tínhamos a ilusão de que possuíamos o melhor
futebol do mundo – que nos havia sido dado pelos céus como um dom
especial e inesgotável – e de que isso bastaria para que a nossa seleção
exercesse o sagrado direito de ser campeã sempre que assim o desejasse.
Poderíamos deitar à sombra e esperar a chegada inevitável do título. Se
fosse necessária uma ajudazinha, bastaria que puséssemos em campo um
pouco da nossa malemolência, do nosso gingado, da nossa malandragem, da
nossa surpreendente improvisação ou, até mesmo, do imbatível jeitinho
brasileiro, para cavarmos um pênalti inexistente ou para deixarmos o
mundo boquiaberto com um dos nossos atacantes que, sem sequer dizer
“shazam”, transformava-se em arma perigosíssima com o simples gesto de
lançar-se ao chão e finalizar deitado. Nem precisávamos treinar direito,
acostumados que estamos com incontáveis feriadões, férias de 43 dias
por ano trabalhado e jornadas camaradas com muitas interrupções e
licenças. Trabalhar pra quê? Pra sofrer como alemães? Afinal, para que
serve aquele supersalário, se não for para aproveitar a vida à sombra do
Dedo de Deus, no conforto protegido do Aviário Comary?
Ironias à parte (que essas talvez até ajudem a descontrair do susto)
temos que tirar lições desse vexame. Não para, simplesmente, mudarmos a
postura dos nossos atletas, muito mais interessados em conquistar pela
aparência, com penteados exóticos, tatuagens enormes, o modo atrevido de
inverter o boné e outras esquisitices, do que em vencer pelo afinco no
treinamento, pela disciplina tática e pela aplicação no trabalho.
Precisamos mudar a própria sociedade e o comportamento dos nossos
jovens, celeiro de onde saem os atletas ávidos da justa ascensão social.
Não lhes serve a crença de que poderão ser bem-sucedidos sem estudar.
Aliás, a cultura é essencial para a melhoria do desempenho esportivo,
para compreensão dos ensinamentos técnicos e para enfrentar a eventual
adversidade. Ninguém pode organizar bem os pensamentos (em campo e fora
dele) trocando o raciocínio lógico e os padrões de comunicação eficaz
por expressões estapafúrdias como o “é tóis”, por exemplo. É
desnecessário que se comente os episódios de choro generalizado, já que
eles estão nítidos na memória de todos e, certamente, são estimulados
pelas imagens diárias exibidas na TV, quando adultos se esmeram em
comover o público com o inevitável pranto por qualquer motivo, à espera
de algum benefício, recompensa ou reconhecimento.
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