sexta-feira, 8 de março de 2013

ARTIGO: Violência doméstica contra a mulher

Érica Verícia Canuto de Oliveira Veras - promotora de justiça/RN

A Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, tornou-se a lei mais popular do país. É considerada pela ONU como a terceira melhor lei de enfrentamento à violência doméstica do mundo. Apesar disso, muitas pessoas ainda pensam que violência doméstica contra a mulher só acontece em locais onde a pobreza, a falta de instrução, o uso de drogas ou o alcoolismo estão presentes. Não é o que a realidade demonstra. E a própria Maria da Penha é prova disso. Uma mulher de classe média, profissional, com terceiro grau em educação, não se olvidou em divulgar a situação de violência que viveu e exigir justiça.

É nessa vertente que a violência doméstica contra a mulher é o fenômeno social, tratado como violação aos direitos humanos. Não é questão privada, como muitos pensam. E a pior orientação que alguém pode dar é que "em briga de marido e mulher, ninguém põe a colher". Ou que ninguém tem nada a ver com os gritos da vizinha pedindo socorro porque ela é a mulher "dele", sua propriedade, e está dentro do espaço privado do lar.

Qualquer pessoa pode e deve denunciar a violência doméstica contra a mulher, seja acionando diretamente a polícia ou o disque 180. Muitas vidas já foram salvas através de denúncias anônimas ou de pessoas que se interessaram em fazer cessar uma grave violação aos direitos humanos.

Ainda há muito preconceito, até mesmo entre aqueles que operam o direito, quanto à mulher vítima de violência doméstica, tendendo a afirmar que, em pouco tempo, ela voltará a conviver com ele e "apanha porque gosta".

Sem adentrar às teorias científicas que buscam explicar a dominação masculina, é preciso compreender que a mulher em contexto de violência (sexual, física, psicológica, moral e patrimonial), muitas vezes é envolvida em uma rede, em que o agressor a torna indigna de credibilidade, a fazendo parecer louca, sem noção da realidade. Há casos em que o agressor engendra uma situação de dependência e dominação tamanhas que a porta está aberta e a mulher não consegue sair.

Geralmente, a mulher não sabe quando e como começou a violência. Tudo começa com a palavra áspera, o desmerecimento, a diminuição enquanto pessoa, mulher, mãe, o xingamento, o sentimento de posse, o isolamento da família e dos amigos, a proibição de vestir roupas e frequentar lugares, o controle dos telefonemas, não poder falar com determinadas pessoas, não poder trabalhar ou ir à escola, evoluindo até o empurrão, o tapa, o puxão de cabelo, fazer sexo contra a vontade, e os espancamentos mais graves.

Por óbvio, em meio a isso tudo, há reconciliações, pedidos de perdão, presentes, promessas, e, mais uma vez, a confiança e a esperança de que tudo vai acabar. Entretanto, o ciclo da violência não é autofágico, não desaparece sozinho. A procura de ajuda é fundamental. É a porta de saída. Muitas vezes, não só a porta da liberdade, da sanidade, do respeito e da dignidade, mas da própria vida.

O exemplo de Maria da Penha, de indignação, não conformação e busca pela sobrevivência, revela que toda mulher vítima de violência doméstica poderá alcançar êxito quando procura ajuda. Há muitos lugares de acolhimento para essa mulher. O que ela deve fazer é conversar, relatar o problema a alguém. Pode ser uma amiga, um familiar, um profissional, um religioso, enfim, uma escuta, um olhar de fora, que argumente, esclareça, revele. Essa ajuda para enxergar é o primeiro passo para que a reflexão se transforme em atitude.

Além da Delegacia da Mulher, Defensoria Pública, OAB, Conselho Municipal da Mulher, ONG's que atuam em defesa da mulher, unidades de saúde, Juizado da Violência Doméstica e da Promotoria de Defesa da Mulher, existe outro espaço de escuta de acolhimento da mulher no Ministério Público. O NAMVID, que tem equipe multidisciplinar, atende diariamente mulheres para orientar, encaminhar e buscar soluções. O silêncio da mulher, e de quem tem conhecimento de uma situação de violência contra a mulher, é o principal alimento para a continuidade da violência. Denuncie!

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