Vindas de uma infância de superproteção, as pessoas que atingiram a maioridade na década de 2010 são classificadas como geração floco de neve. Ao mesmo tempo que afirma ser empoderada e bem-resolvida, essa é a geração mais instável emocionalmente de que se tem notícia.
O termo foi criado por Chuck Palahniuk, autor de O clube da Luta, se referindo ao fato de que “ninguém é especial, ninguém é um floco de neve”. Isso porque nenhum floco de neve é igual ao outro, cada um deles é único e especial, ao contrário das pessoas, considerando o fato de que nenhum de nós é melhor do que o outro.
A questão é que essa geração está assumindo posições estratégicas na política, no mercado de trabalho e em todos os demais setores da sociedade e, assim como são instáveis, voláteis e confusos – uma vez que percebem não ter os superpoderes que seus pais disseram que tinham – boa parte de suas ações são tão incoerentes quanto seus pensamentos.
Não deveria ser necessário dizer que isso é uma generalização, e que obviamente não se aplica a todas as pessoas dessa geração, porém, esta é outra característica dos flocos de neve: impor a todo mundo a necessidade de explicar o óbvio, pois podem se ofender profundamente por tudo e por nada.
Para citar todas as incoerências que temos testemunhado de uns tempos para cá seria necessário desenvolver uma série de textos que, honestamente, poderia nos desanimar da vida em si. Portanto, vou me ater a apenas alguns pontos que dão uma pequena amostra da bipolaridade dessa sociedade que se diz moderna e avançada.
Testemunhei, com muita tristeza, relatos de pessoas que são a favor apropriação de imóveis que, segundo alegam, não cumprem sua “função social”. Conversando com uma dessas “adultas floco de neve”, ela me disse: “Querida, você é tão inteligente, mas ao mesmo tempo tão bobinha... Deixa eu te contar uma coisinha, ‘amore’: nem todo mundo herdou uma casa e bastante dinheiro como você, sabia? Se nós não invadirmos, nunca teremos onde morar com dignidade, entendeu agora, ‘migue’?”
Respirei fundo e respondi: “O que eu não entendo é de onde você tirou a ideia de que eu herdei alguma coisa. Sou filha de um alcoólatra que não me deixou absolutamente nada, a não ser a vergonha de pedir dinheiro emprestado para pagar seu próprio enterro. Tudo o que tenho é fruto de trabalho árduo, então, se uma ‘ninguém’ como eu foi capaz, por que você não seria?”
Ela simplesmente não sabia o que dizer e, ao mesmo tempo que afirmava que também podia vencer na vida, que era inteligente, talentosa e empoderada, dizia que se o governo e a sociedade não a ajudassem, não chegaria a lugar algum. E questionava: “Meu, se tem uma casa ali, linda, enorme, com quarto sobrando, empregados e ‘pá’, por que eu não posso morar lá? Me explica, cara!” Acho que nem mesmo Freud explica...
É realmente muito triste ver pessoas adultas pensando, falando e agindo como crianças mimadas. E é mais triste ainda saber que são assim por terem crescido em um mundo fantasioso onde – ainda que com a melhor das intensões – os próprios pais erraram a mão ao quererem ser o deus de seus filhos.
O saldo dessa operação tem sido bastante negativo, mas até mesmo pela minha própria história de vida, creio que todos nós podemos fazer o nosso destino, ainda que tudo jogue contra. É possível que a geração floco de neve se torne resiliente, forte emocionalmente e, de fato, empoderada. Apesar de tudo, tenho fé de que isso pode acontecer. Até porque, o que mais nos resta a não ser ter fé?
Autora
Patricia Lages é autora de 5 best-sellers sobre finanças pessoais e empreendedorismo e do blog Bolsa Blindada. É palestrante internacional e comentarista do JR Dinheiro, no Jornal da Record.
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