Por Luís Fernando Verissimo
Na semana passada estava entrando num banco para ver se tinha restado
algum trocado, até o dia da “viúva” (INSS) fazer o depósito. Foi quando
uma linda garota de uns quarenta anos, minissaia, entrou na fila dos
caixas, imediatamente saí da fila dos idosos e também entrei na mesma
fila.
Em pouco tempo ela olhou para trás e sorrindo disse:
- Por que o senhor não utiliza a fila dos idosos?
Você sabe para que lugar eu tive vontade de mandá-la, não é?
Porém, mantive a calma e usei toda minha experiência. Puxei papo e
resolvi inventar, para impressionar. Falei das minhas “experiências como
comandante de navio de cruzeiro”. Semana passada havia lido um livro
sobre um comandante de navio de turismo. Sabia tudo a respeito.
- Uau! O senhor foi comandante de transatlântico?
- Só por vinte e dois anos.
Respondi expressando uma certa indiferença pelos anos de trabalho,
mas sentindo que tinha capturado a presa, era só abater e comer.
- Nossa!!!! E com essa sua pinta o senhor deveria, certamente,
agradar muito o público feminino, nas noites de jantar com o comandante.
Boquiaberto só pude responder:
- Hã? – distraído que estava de olho fixo no decote da jovem, que exibia, exuberantemente, seus lindos seios.
Ela me pegou no flagra. Eu sem graça, e ela não fez por menos!
- O senhor ficou vermelho! Ficou até mais bonito. Aliás, o senhor deveria fazer um teste na televisão.
Eu estava perplexo e apavorado, depois dos sessenta, isto acontece
uma só vez antes da morte. Aquele avião pronto para decolar e eu sem
condições nem mesmo de efetuar o check in. Sim, não sabia ao certo quanto teria na conta corrente…
Quanto estaria custando um Viagra?
… Onde poderia arrumar duzentão, até o dia do depósito da “viúva”?
… Quanto estariam cobrando um apê no motel?
Será que se chamar um táxi pega bem? Comecei a suar frio.
- Eu, artista de televisão?
- Sim! O senhor lembra aquele famoso galã dos anos cinquenta, que minha avó me mostrou na revista Rainha do Rádio.
Ela tem verdadeira paixão por essas revistas. Adorava Marlene, Emilinha
Borba… Deus nos livre de alguém mexer nas suas revistas. Ela guarda a
sete chaves, com o maior carinho. O senhor é saudosista também?
- Sim! Mas, você tá me gozando. Galã dos anos cinquenta?
- Verdade… Não me lembro bem o nome, só sei que ele fazia filmes para
o cinema, era muito famoso. Ma.. Mário, não era. Era alguma coisa como…
Ah sim, tinha dois “Z” no nome.
- Mário Gomezz (apelei)?
- Não, não era este o nome. Ahhh lembrei… Mazzaropi? Isto Mazzaropi! Mazzaropi era um galã, não era?
Nesta hora minha autoestima fez um buraco no chão e foi parar na terra do sol nascente.
Pô, quando ela disse que eu parecia galã dos anos cinquenta, pensei
num Paulo Gracindo, Paulo Autran, ou algum Antonio Fagundes da vida.
Mas, Mazzaropi?… PQP! Mas, até aí tudo bem, para pegar aquele avião eu
ia de Mazzaropi mesmo.
O meu fabuloso programa da tarde só veio a acabar, quando ela
incautamente, derrubou um livro que tinha na mão. Eu, como um verdadeiro
cavalheiro, inventei de abaixar para apanhá-lo. Só que esqueci as
recomendações do meu ortopedista sobre minhas artroses e artrites, que
quando eu me abaixasse, o fizesse de uma forma bem vagarosa.
Enquanto o livro descia, eu mais que depressa, inventei de pegá-lo na
altura dos joelhos desnudos da jovem. Só escutei a frase dela:
-Uau! Que reflexo – você parece um garotão!
Ouvi esta frase, e mais dois sons. Um som abafado da região da minha
coluna que travou no ato, e o som estridente de um prolongado peido, que
além de sinalizar a frouxidão do rabo, lembrou-me da intensa dor na
coluna. E quem disse que eu conseguia endireitar o corpo, nem chamando o
Carvalhão.
Arcado, tentava me endireitar e peidava. Tentava, e novamente
peidava. Pô, o pior, que há pouco tinha almoçado num restaurante alemão.
Imagina o odor?
A jovem vendo que a situação não reverteria, tirou os dois dedos que
apertavam suas narinas, apanhou o celular e discou para o SAMU. Fim de
um provável romance…
Adorei este texto desse escritor,que faz vc ri imaginando a cena.Sensacional.Ri muito com a final da narrativa.O Brasil tem uma grande riqueza cultural que são esses grandes mestres da palavra.Eles são imortais.
ResponderExcluirPura verdade cara Fátima; Luis Fernando é sensacional.
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