segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

“Clarice Lispector: a escritora e sua escrita”

(Clarice Lispector, 2004)

Clarice Lispector é sem dúvida um dos nomes mais importantes da literatura brasileira. Desde sua estréia, sua obra está associada à representação da ruptura com a tradicional forma de narrar até meados do século XX.  Seu nome tem repercussão a nível nacional e internacional. Enquanto seu prestígio é maior nos meios intelectuais e acadêmicos, suas crônicas fizeram-lhe uma voz familiar para um público amplo, heterogêneo.

Nascida nos anos de 1920, a 10 de dezembro, em Tchtchelnik, uma aldeia da Ucrânia, Haia Lispector, filha de Pinkouss e Maria Lispector. Após seu nascimento, ocorre a emigração rumo à América. A família chega em Macéio no ano de 1922 e são recebidos por familiares. No Brasil, adotaria novos nomes, mudariam de “identidade”: o pai se tornaria Pedro; Mani, Marieta; Leia, Elisa; e Haia em Clarice.

Vemos também que esse novo nome pode ser entendido, a partir da definição apresentada em Cadernos de Literatura Brasileira, Clarice Lispector, organizado pelo Instituto Moreira Salles (2004, p. 08), como uma nova identidade: “trata-se de outro nome e de outra pessoa, já que ela não se reconheceria mais como Haia, uma vez que a mudança em seu nome significou a mudança de função”.

Clarice inicia sua vida como escritora ainda criança, com sete anos de idade, escrevendo contos para o Diário de Pernambuco. O ano que marca a estréia de Clarice é 1940, quando lança, no seminário Pan, o conto Triunfo.

Perto do Coração Selvagem (1943) é o primeiro livro publicado por Clarice Lispector, surge no cenário das letras brasileiras rompendo com a estrutura cronológica de início, meio e fim; pois na obra clariceana, mais importa o fluxo de consciência de seus personagens. Em 1946 publica O Lustre, que narra a história de Virgínia e sua relação com o irmão Daniel, predominando o estranhamento. Logo após, escreveu A Cidade Sitiada (1949), apresenta Lucrécia como protagonista, tomando inúmeras imagens e representações para construir esse mundo ao redor da personagem. A Maçã no Escuro (1961), narra a história de Martim, que mata a mulher e foge. A Paixão Segundo G.H (1964), tem uma barata como ponto essencial para perceber a diferença entre o eu e o outro.

Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres (1969) narra a história de Ulisses, professor de filosofia, e Lóri, professora primária.  Água Viva (1973) apresenta um monólogo dialogado de um eu e um tu, apresentando marcas do abstrato. A Hora da Estrela (1977), último publicado em vida, mostrando Macabéa como protagonista, uma mulher semi-analfabeta, pobre, que sai do nordeste e vai tentar a vida no Rio de Janeiro. Um Sopro de Vida foi publicado postumamente, e tem como foco a temática da morte.

Laços de Família (1960) é uma coletânea de treze contos consagrado pela crítica por serem construídos a partir de fendas que permitem diferentes apreensões, além de ser uma crítica social explícita, sem meias palavras.

As obras que reúnem contos não páram com Laços de Família. A autora publica ainda: A Legião Estrangeira (1964), escrito no mesmo ano de A Paixão Segundo G.H, o livro se divide em duas partes: uma composta de textos maiores; a outra sob o título Fundo de Gaveta apresenta contos curtos. Em linhas gerais, são tratadas questão da alteridade.

Felicidade Clandestina (1971), em uma coletânea de vinte e cinco contos são tematizadas: infância, adolescência e família. Em A Imitação da Rosa (1973), Clarice aborda os sentimentos humanos.  A Vida Crucis do Corpo (1974) foi um livro encomendado por Álvaro Pacheco que buscava fatos que “realmente aconteceram”; os contos – escritos em três dias – abordam sexo e crime, mostrando prostitutas, travestis, mendigos, marginais, que apresentam uma vida noturna ativa.
 
Onde Estivestes de Noite (1974) é composto de dezessete narrativas que apresentam dores e aflições do cotidiano da vida carioca. A Bela e a Fera (1979) é dividido em duas partes: a primeira composta por contos já publicados anteriormente; a segunda por dois inéditos.

A escrita lispectoriana fala de sensações, acontecimentos recorrentes e temas de superação, dificuldades no amor, descobrimento do eu, enfim, a autora toca nas inquietações que perturbam o ser humano, sendo considerada a maior ficcionista de sua geração.

Sendo assim, a forma clariceana de escrever explora a fragilidade do ser, e a autora o faz despertar para as questões que o inquietam. A liberdade é sempre um só instante e a escritura de seus contos é centrada mais no estado da alma, mostrando que a vida pode ser escrita e lida através das críticas sociais.
A literatura lispectoriana vai muito além do espaço doméstico do seu cotidiano, investindo em novidades estéticas antes não vistas na literatura brasileira, optando pelo “mau gosto”, ou seja, ela tem uma atitude diante da realidade social, que se apresenta cada vez mais degradada, fadada ao fracasso.

Nos escritos da autora predominam a procura pelo interior das personagens, o autoconhecimento, a resolução dos questionamentos em torno do eu; outrossim, busca-se a identidade perdida. Constatamos em suas tramas um interesse por personagens mulheres, ocupando o espaço privado da casa, vivendo em função deste e da família; e a partir de um certo instante, denominado pela crítica como momento epifânico, essas personagens despertam para sua real condição  e passam a se questionar sobre suas vidas, vivendo dramas existenciais em permanente busca para compreender-se, questionando-se “quem sou eu?”, onde ocorre o desenvolvimento de uma auto-reflexão.

Identificamos que há uma densidade introspectiva na obra de Clarice Lispector. Suas personagens refletem o dia a dia, são fadadas ao fracasso, inquietantes, tendo como ponto principal a estranheza, a descoberta do eu, ou seja, aquilo que lhe causa medo e terror, gerando a angústia.
Através da sua escrita inovadora Clarice inaugurou no cenário das letras nacionais uma nova forma de fazer literatura, investindo em outro horizonte de expectativa, uma nova percepção da vida.

Texto produzido por  Flávia Melo
Aluna Mestrado PPGL/UERN
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